Alto, corpulento e ostentando
farto bigode preto, aquele primeiro-tenente do Exército deveria fazer tanto
sucesso entre as mulheres, como talvez faça o Kim ‘pançudo’ da Coreia do Norte.
Contudo, apesar de formado na conceituada academia das Agulhas Negras, nosso
protagonista não tinha prestígio entre seus subordinados. Com sonoras
gargalhadas, soldados e cabos mofavam da ignorância daquele oficial com tanto
entusiasmo, que lhe deram por alcunha a enigmática sigla ‘CP’. De minha parte,
confesso ser inocente nesse e em outros ‘crimes’ da farda, mas quando o assunto
era “CP”, eu ficava sempre à espreita e me deliciava com as estórias envolvendo
aquele homem.
Talvez o raro leitor não saiba,
mas o contingente de um quartel é dividido em ‘castas’ – para desculpas da
hierarquia. No topo, há os oficiais (tenentes, capitães etc.); depois os
graduados (sargentos e subtenentes); por fim, a ralé (cabos e soldados). O
cidadão civil, denominado ‘paisano’ no jargão militar, era sempre visto com desconfiança
naquele meio. As maliciosas línguas sempre diziam que “paisano em quartel é
mulher de soldado”.
Pelo menos no tempo em que servi,
os oficiais dificilmente chamavam alguém da ‘casta inferior’ pelo nome. Era
comum, no pavilhão superior do prédio, um oficial debruçar-se sobre a
balaustrada à espera de um soldado de passagem pelo pátio. À primeira “vítima”,
bradava: “Oooooô... Soldado!”. Muitas vezes eu ouvia e me fingia de surdo,
escapando apressado dali. Saía da mira do cara e vazava para o alojamento, ou
garagem, ou rancho, ou não-sei-pra-onde, fugindo de enfadonhas tarefas.
Certa vez, houve um temporal e o
aguaceiro inundou várias repartições do quartel. O CP era um dos homens
encarregados de avaliar o estrago e encaminhar soluções. Dirigiu-se a mim, sem
citar meu nome, é claro, e me conduziu ao paiol – onde se guardam munições e
explosivos. Estava tudo alagado, um caos. E aí, o CP cofiou o bigode, sem saber
o que fazer, e lascou esta: “Essa chuva foi com ‘xis’ maiúsculo!”, disse em
carregado ‘carioquês’. Essa foi
apenas uma constatação que justificou a maledicência dando conta de que o CP
não passara no exame de ingresso à academia, mas que o diretor da instituição
arrumou um jeito para ele entrar, não se sabe como. Sabe-se, porém, que o
diretor era um coronel, e que esse coronel, por coincidência, era o pai do CP.
Só isso.
Tempos depois, o CP, já há muito desconfiado, interpelou alguém,
querendo que lhe explicasse o significado de ‘CP’. Por sorte havia um cabo cujo
nome salvou o soldado. “Tenente, ‘CP’ é o cabo Prudente. O senhor não sabia?”
Nem sei por que escrevi esta
crônica. Ou sei: talvez seja porque temos na Presidência um contemporâneo e
colega de academia do PC. Tudo a ver com o título.
FILIPE
Nenhum comentário:
Postar um comentário