Esse é o meu tio Simeão, mais
conhecido por Soadão – um apelido pra
lá de esquisito, eu sei, mas ele é gente boa pra caramba.
Então, hoje o tio Simeão faz 71
anos. Idade já bem avançada, mas ocultada pelo vigor físico e a alma sapeca de
quem nos faz rir até mesmo de suas trombadas com a vida.
Certa vez, isso aconteceu há
muitos e muitos anos, mamãe estando na casa dos pais e já cansada de me
sustentar em suas entranhas, resolveu me despachar para a vida. E quando ela me
deu à luz, o meu tio Simeão estava todo pimpão, porque naquele dia ele
completava nove aninhos. E a partir de então eu passei a ser uma espécie de
afilhado desse tio. Tanto é que, sempre que podia, ele me dava presentes no
nosso aniversário.
Interessante é que, se antes essa
diferença de nove anos era uma enormidade, hoje ela nos é insignificante.
Talvez essa pudesse ser a prova mais convincente da relatividade do tempo, que
ficaria sempre parado enquanto nós vamos passando por ele.
Naquele tempo, por vezes o tio me
pegava em casa e me levava pra casa dele ainda na véspera do aniversário, e o tão
aguardado 23 de dezembro já amanhecia festivo. O almoço, para dezenas de
pessoas, começava a ser preparado desde bem cedinho por minha avó e minhas tias
e seria servido no começo da tarde, estendendo-se até quase o anoitecer. Comida
simples, mas saborosa e farta, não faltando arroz, tutu acebolado, macarronada
e carne de porco ou frango. À noitinha eram servidos os doces, invariavelmente arroz
doce, doce de leite em pedaços, pé de moleque, doce de mamão em bolotas, mingau
de milho verde etc.
Esses festejos começaram quando o
tio Simeão ficou maiorzinho, podendo trabalhar fora e ganhar algum dinheiro. Pelas
minhas lembranças, a nossa primeira festinha foi quando eu fiz seis ou sete anos,
sendo ele ainda um rapagote. E assim, o mês de dezembro passou a marcar
‘dois grande eventos’ para mim: início
das férias escolares e a “minha” festa de aniversário.
A nossa última festinha foi
quando meu tio fez ‘vinte e um’ e eu ‘doze’. Era uma manhã sorridente, de sol forte
e calor intenso, como foi hoje. Eu estava na casa dos avós maternos e aconteciam
os preparativos para o almoço, que seria um pequeno banquete como sempre foi nessa
data. Havia já bastante gente e ainda mais pessoas estariam por chegar. De repente
minha tia Gracinha chega, interrompe tudo, e diz quase sem fôlego: “Gente, o
Sebastião Lopes Morreu!” Padrinho do tio Simeão, o vovô Sebastião partiu no dia
do nosso aniversário, levando consigo a alegria de uma festa que não chegou a acontecer
e que nunca mais se repetiria.
Sou muito grato a esse tio por
tudo que ele fez para alegrar minha infância. Enquanto na minha casa ninguém
podia fazer festa devido às nossas dificuldades financeiras (pobreza mesmo), o
meu aniversário era ansiosamente esperado por todos e ricamente festejado pelo
tio, com quem nos jubilávamos.
Cinquenta anos nos separam da nossa
última festinha, e esse tempo passou rápido. Só não passou o meu carinho pelo
tio Simeão, a quem sou eternamente grato e lhe desejo uma vida longa e feliz.
FILIPE