Confesso que me esforcei, mas acho
que não consegui fazer direito. A minha cozinha estava toda enfumaçada, com
picumãs descendo sobre minha cabeça e as paredes bem encardidas. Depois de
tanto procrastinar, meti a mão na tinta e dei uma boa caprichada. Mas o fogão
continua fumê, esperando por um tio que prometeu usar até uma cavadeira para,
segundo ele, remover a crosta de carvão. Maldade dele, porque o meu fogão não é
mais fumarento e nem está tão sujo assim.
O meu objetivo aqui nem seria falar
do fogão, que está feliz desse jeito meio sujão,
mas o assunto seria as paredes, que foram pintadas após anos me implorando por um
banho de tinta branca. Sobre o fogão, acho melhor deixá-lo assim mesmo, porque
descobri que ‘cozinheiro bom é cozinheiro porco’ e, dessa forma, a cozinha pode
ficar ‘mais ou menos, que já tá bom demais.
Você que me lê observe uma
coisa. Se um dia for comer na casa de um amigo ou num restaurante e achar a
comida deliciosa, é melhor não bisbilhotar a cozinha, porque, com raríssimas
exceções, o cozinheiro é um porcão. Há
um ditado com alguma lógica, mas pra lá de preconceituoso, que diz: “Quer boa
comida, siga os gordos!”. Se é verdade que apenas os gordinhos conhecem o caminho
da ‘boa mesa’, não posso afirmar, mas posso afiançar que alguns “porquinhos”
são bons quituteiros – o que não exclui a hipótese de que haja “porcões”
fazendo comidas horríveis por aí.
Contudo, a recíproca para essa
minha tese não é verdadeira. Se “porquinhos” fazem comida boa, não significa
que toda comida boa seja exclusividade de “porquinhos”. Pois sabemos por
experiência e vivência que há muita gente limpinha, sobretudo mulheres, fazendo
comida maravilhosa por aqui, por aí, por lá e acolá.
Quando falo de ‘cozinheiro
porco’, eu me refiro apenas e tão somente à lida dele com pratos e panelas e
também da falta de zelo com os ingredientes que está usando. Nem ouso falar
daqueles que deixam a cozinha para ir ao banheiro e voltam de lá com as “mãos
sequinhas”, se é que me entendem.
O ‘cozinheiro porco’ costuma usar
muitos panos de prato, que pega limpinhos na gaveta, e os deixa espalhados
pelas pias e mesas. Volta e meia ele pega um e põe no ombro e este faz “milagres”
na sua mão. Com esse pano ele pega panelas quentes, enxuga conchas e escumadeiras,
passa sobre a barra do fogão e, de vez em quando, remove o suor da testa.
A cozinha, todo sabemos, é a
arena do cozinheiro, e ali ele é um gladiador bem nutrido e bem armado, que,
com boas facas, resolve qualquer parada, desde a desossa de um pernil até a
expulsão de um intruso.
E, assim, encerro a crônica que
teria como mote a pintura da minha cozinha, mas me ative ao fogão e seu
cozinheiro, que talvez seja eu mesmo.
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