Publicado no jornal “A
Tribuna de Amparo” – edição de 20/03/2020
Sonel para uns e Nelson para muitos,
o bom mineiro de Jacutinga, a quem chamo carinhosamente de Alemão, é
funcionário do Lar dos Velhos de Amparo há anos. Seu trabalho é silencioso e
incessante, como o das formigas. Sempre que o vejo naquela casa, lá está ele frenético,
com balde, vassoura e rodo, cuidando da limpeza. Ora o vejo ensaboando e esfregando
o chão, ora está enxaguando ou enxugando pátios, alas internas, banheiros e
corredores. O Sonel está sempre no labor, mas quando me vê, larga tudo e,
braços abertos, vem dizendo: “Ô, meu amigo, eu quero te dar um abraço!” E então recebo aquele abraço ‘caudaloso’, como
diria o poeta Manoel de Barros. De volta ao serviço, exagera: “Agora, sim, está
tudo bem, porque abracei meu amigo.”
Do Sonel, pouco sei. Não posso
tomar seu tempo com conversas, porque a minha prosa nada acrescentará ao seu
rico repertório de vivências. Mas da última vez, arrisquei e lhe fiz umas duas
ou três perguntas. Então soube ser ele mineiro, e um pouco mais: vem de uma
família de onze irmãos, dos quais dois partiram cedo. Cedo também foi seu
ingresso no trabalho. Pequenino, já acompanhava os pais numa olaria e, a partir
dos quatorze anos, pegou firme na massa – literalmente. Começou amassando barro,
depois fazendo tijolos, montando caieiras. Poucos sabem quão duro é o trabalho
de um oleiro, principalmente nas priscas eras pré-tecnológicas. Antes de ingressar
no Lar dos Velhos, o amigo trabalhou noutras coisas além da olaria, chegando a
ganhar a vida como garçom.
O que realmente impressiona nesse
rapaz é a alegria, a disposição e seu espírito sempre elevado. Não se vê o Alemão
“pra baixo”, ensimesmado, embora ele deva ter lá os seus perrengues. Até porque,
com a carestia de hoje, a vida não está nada fácil para quem é assalariado. Ademais,
as nossas agruras, talvez a do amigo também, não são apenas financeiras. Há uma
densa nuvem de tempestade obscurecendo o horizonte deste país, que é capaz de
desassossegar até as mais rasas e rudes almas.
Mas no Lar dos velhos de Amparo,
temos a alegria Alemão, que está sempre oferendando um sorriso a quem chega. Pessoas
como o Sonel tornam mais leve a nossa vida e suavizam a pedregosa existência de
nossos velhinhos.
FILIPE