São exatamente sete horas da
manhã de quinta-feira. Estou numa sala de aula fria e sem alunos quando ligo um
pequeno notebook. O antigo, o ‘titular’, começou a falhar, como têm falhado os
titulares das seleções que espraiam nos gramados russos nesta Copa – exceto o
CR7.
Um professor entra na sala e faz
breve reflexão sobre a vida, o trabalho, os embaraços da profissão e fala também
sobre o abandono da educação, o desperdício de material didático etc. Livros
caríssimos são descartados ainda dentro da embalagem – assim ele os recebe em
uma fábrica de papelão onde trabalha à noite. Não fala sobre a Copa do Mundo,
mas lamenta o mau humor dos brasileiros. Após breves e introspectivas lucubrações,
conclui: “As pessoas estão amarguradas”. Concordo com o colega e volto ao
teclado.
Por falar em Copa do Mundo, no segundo
dia de jogos, eu estava na casa de um amigo, a quem visito regularmente, quando
na TV passava Portugal e Espanha. Contra o esquadrão espanhol havia Cristiano
Ronaldo que, sozinho, marcou três gols, empatando a “bagaça”. Alheio ao jogo, o meu amigo fazia perguntas, que eu
respondia sem que ele compreendesse a resposta. Então ele repetia a pergunta e
eu repetia a resposta para, enfim, dar-se por satisfeito.
Havia também na sala dois jovens
– um deles, neto do meu amigo. A certa altura, um dos rapazes, não o neto, perguntou:
“Que dia o Brasil vai jogar contra a Suécia?” “Não é contra a Suécia, é contra
a Suíça, corrigiu o neto” “Ah, não é a mesma coisa?... Pensei que fosse. Como
começa com ‘s’, eu me confundi”, tentou disfarçar a gafe.
O jogo seguia: Cristiano Ronaldo contra
o resto. O rapaz, agora refeito do vexame anterior, pareceu-se surpreso com uma
tal ‘Arábia Saudita’, que jogaria a Copa. “Mas Arábia Saudita é um país? Pois
eu não sabia. E onde fica a Arábia Saudita?” “Sei não, fica longe. Acho que é na
África, né professor?”, respondeu o neto, pedindo reforço. “A Arábia Saudita
fica bem longe daqui, depois dos mares, lá na Ásia. É um daqueles países cheios
de petróleo”, acudi.
Na sala de aula, onde me encontro
sem alunos e sem estresse, vou preenchendo formulários e, de vez em quando, testo
meu computador. Não sei por quê, mas a tecla de ‘interrogação’ ficou amalucada
e o sinal passou a sair de ‘ponta cabeça’. Aborrecido, pedi ajuda a uma professora,
que resolveu o problema incontinenti. Obrigado, colega, porque agora posso
voltar a ser feliz!
Na sala de computadores, alguns
alunos, que deveriam fazer pesquisas, divertem-se nas redes sociais. Um assiste
a uma série, uma está no Facebook e outra, a meu pedido, pesquisa figuras planas:
quadriláteros e triângulos. Os desenhos todos tortos, mas... eu me contento com
pouco.
De súbito, um ‘fúnqui’ brota forte de um daqueles
computadores e eu fico apavorado. Desligo o notebook e deixo a sala, lançando sobre
todos um olhar severo, de quase maldição.
Já em casa, assisto ao segundo
tempo de Argentina e Croácia. Sofro porque torço pelos latinos, que sofrem em
campo. Os croatas marcam o terceiro e os hermanos
perdem o jogo e a cabeça.
Sexta-feira de manhã. Saio pelas
ruas desertas, a cidade está silente. Na TV, a voz rouca e ufanista do “babão”
deve estar narrando o jogo contra os costa-riquenhos; no gramado, meu xará abre
o placar para o Brasil e o “brega júnior” amplia. Agora, sim, o Brasil vai para
frente. Com este Brasil indo, eu prefiro voltar. Mas voltar para onde, se
“Minas não há mais”?
FILIPE