Estamos na virada do ano de 2022 para 2023. O momento – a que
todos dão o “sofisticado” nome de ‘réveillon’ e lhe atribuem tamanha
importância – para mim, e os três cães que estão aos meus pés, não faz o menor
sentido. Nós quatro – Pituka, Tiziu, Tokinho e eu – achamos que esta é uma
noite como todas as demais, com a diferença de que hoje haverá uma rajada de
rojões perturbando a nossa paz e a de tantos – incluindo nessa conta os outros
cães, gatos, passarinhos e pessoas com deficiência.
Agora, neste exato momento, os três estão dormindo tranquilamente.
Daqui a pouco, lamentavelmente, eles serão atormentados com as explosões
pirotécnicas sem nenhuma razão de acontecer. Uma insanidade.
O ano que termina foi marcante na minha vida. Nesse período, tive
duas grandes e sofridas perdas; todavia, não posso negar que tive também
algumas importantes conquistas. Aconteceram, contudo, rupturas tristemente
necessárias; no entanto, laços importantes foram restaurados ou reforçados. De
fato, o ano de 2022 será inesquecível para mim sob muitos aspectos.
Eu queria escrever mais sobre o ano que finda, pormenorizando cada
marca que deixou em mim, mas não consigo. Daqui a pouco meus cãezinhos serão
despertados pelos rojões e eu preciso cuidar deles. Neste exato momento os três
dormitam como que protegidos por mim, mas eu não consigo lhes dar proteção
alguma.
Na telinha do celular, o Jornal da Cultura está sendo exibido, mas
a internet está falhando e a apresentadora gagueja, gagueja e gagueja. Algo no
celular roda, roda... tentando conexão, e nada. Enquanto isso, vou digitando,
tomando chimarrão e ouvindo um burburinho de festa, que vem de longe e me tira
a atenção.
Neste momento, a poucos minutos para a meia-noite, os cães dormem
como se não houvesse réveillon. Dá dó de saber que o ‘foguetório’ vai acontecer
daqui a pouco e vai revirá-los do avesso. Um pânico acometerá a todos e eu me
sentirei impotente diante de tudo o que vai acontecer. Tentarei agradar com
petiscos e não funcionará; darei homéricas broncas, e vai piorar a coisa; por
fim, eu também ficarei com eles e como eles: atordoado, andando em círculo.
Encerro o texto para tentar entreter os cães. Daremos uma volta no
bairro? Talvez. Ah, os rojões hão de passar, e há de haver réveillon sem fogos!
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