sábado, 23 de dezembro de 2023

SIMEÃO

 


Esse é o meu tio Simeão, mais conhecido por Soadão – um apelido pra lá de esquisito, eu sei, mas ele é gente boa pra caramba.

Então, hoje o tio Simeão faz 71 anos. Idade já bem avançada, mas ocultada pelo vigor físico e a alma sapeca de quem nos faz rir até mesmo de suas trombadas com a vida.

Certa vez, isso aconteceu há muitos e muitos anos, mamãe estando na casa dos pais e já cansada de me sustentar em suas entranhas, resolveu me despachar para a vida. E quando ela me deu à luz, o meu tio Simeão estava todo pimpão, porque naquele dia ele completava nove aninhos. E a partir de então eu passei a ser uma espécie de afilhado desse tio. Tanto é que, sempre que podia, ele me dava presentes no nosso aniversário.

Interessante é que, se antes essa diferença de nove anos era uma enormidade, hoje ela nos é insignificante. Talvez essa pudesse ser a prova mais convincente da relatividade do tempo, que ficaria sempre parado enquanto nós vamos passando por ele. 

Naquele tempo, por vezes o tio me pegava em casa e me levava pra casa dele ainda na véspera do aniversário, e o tão aguardado 23 de dezembro já amanhecia festivo. O almoço, para dezenas de pessoas, começava a ser preparado desde bem cedinho por minha avó e minhas tias e seria servido no começo da tarde, estendendo-se até quase o anoitecer. Comida simples, mas saborosa e farta, não faltando arroz, tutu acebolado, macarronada e carne de porco ou frango. À noitinha eram servidos os doces, invariavelmente arroz doce, doce de leite em pedaços, pé de moleque, doce de mamão em bolotas, mingau de milho verde etc.

Esses festejos começaram quando o tio Simeão ficou maiorzinho, podendo trabalhar fora e ganhar algum dinheiro. Pelas minhas lembranças, a nossa primeira festinha foi quando eu fiz seis ou sete anos, sendo ele ainda um rapagote. E assim, o mês de dezembro passou a marcar ‘dois grande eventos’ para mim:  início das férias escolares e a “minha” festa de aniversário.

A nossa última festinha foi quando meu tio fez ‘vinte e um’ e eu ‘doze’. Era uma manhã sorridente, de sol forte e calor intenso, como foi hoje. Eu estava na casa dos avós maternos e aconteciam os preparativos para o almoço, que seria um pequeno banquete como sempre foi nessa data. Havia já bastante gente e ainda mais pessoas estariam por chegar. De repente minha tia Gracinha chega, interrompe tudo, e diz quase sem fôlego: “Gente, o Sebastião Lopes Morreu!” Padrinho do tio Simeão, o vovô Sebastião partiu no dia do nosso aniversário, levando consigo a alegria de uma festa que não chegou a acontecer e que nunca mais se repetiria.

Sou muito grato a esse tio por tudo que ele fez para alegrar minha infância. Enquanto na minha casa ninguém podia fazer festa devido às nossas dificuldades financeiras (pobreza mesmo), o meu aniversário era ansiosamente esperado por todos e ricamente festejado pelo tio, com quem nos jubilávamos.

Cinquenta anos nos separam da nossa última festinha, e esse tempo passou rápido. Só não passou o meu carinho pelo tio Simeão, a quem sou eternamente grato e lhe desejo uma vida longa e feliz.

FILIPE


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