“Um
povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la”.
Essa frase é atribuída ao pensador irlandês Edmund Burke, que não conheço. Sei
que ele foi um cara importante, porque vi na Wikipédia. Quem quiser saber mais
sobre esse filósofo, não perca tempo, pois o Google não deixa ninguém mais na
ignorância.
Mas a frase que abre este texto já me acompanha desde os
amarelados tempos de adolescente. Certa vez a escrevi num papel-cartão e afixei
na porta do quarto da pensão onde eu morava. Gostei daquela frase desde que a
conheci e achei que a exibindo, eu poderia ofuscar minha ignorância, exalando
certos vapores de intelectualidade.
Deixando de lado aquela famosa frase e seu (para mim) obscuro
autor, quero falar de outra história: a que papai conta. Durante esta
quarentena, que tem provocado muito bafafá entre as nossas desautorizadas
autoridades, não estou sem trabalhar conforme dizem alguns linguarudos de
Brasília. Estou trabalhando muito, porque estou digitando e editando as
memórias de meu pai. Este é o terceiro livrinho que papai escreve, contando um
pouco do que ele viveu e ouviu ao longo de uma vida de nove décadas.
Papai é uma usina de informações. Ele já me mandou vários
manuscritos e continua mandando mensagens ou me ligando para fornecer mais
matéria-prima para sua obra. Eu me sinto um pedreiro que está fazendo uma
casa. O velho vai me mandando o material: tijolos, cimento, pedra, areia, cal,
ferragem, madeira e muito mais – tudo de primeiríssima qualidade. Eu terei que
corresponder, edificando seu castelo, vendo onde devo encaixar tal pedra, como
levantar tal parede, armar as estruturas de aço, ver o traço do concreto etc.
Se o material é de excelente qualidade, a mão de obra parece meio capenga e
poderá deixar um pouco a desejar. Mas sou esforçado.
Comigo está um bom trecho da vida do meu pai, dos pais dele, do avós,
dos bisavós, chegando ao trisavô do meu pai, que também é um bisavô. Este, um Adão solitário, sem a Eva,
porque não se sabe o nome da trisavó do papai. Somando a idade de meu pai com
as quatro gerações anteriores a ele, são uns 200 anos de história. E meu pai
cita nomes e sobrenomes, formando uma infinita rede de ligações
parentais. De todos da geração de meu pai, apenas ele sabe contar essas
coisas.
Neste livro, embora meu pai tenha tido um propósito mais
generalista, ele se ateve ao meu avô. Dessa forma, o senhor Sebastião Lopes de
Lima tornou-se protagonista desta coletânea. Fatos corriqueiros, mas de grande
comicidade, são relatados no estilo leve, solto e quase descompromissado de meu
pai. Mas toda a história narrada é veraz, sendo o meu velho uma valorosa fonte
primária.
Diversamente do pensamento que abre este texto, eu não me sentiria
condenado se tivesse que repetir a história de meu pai. Pois, para fechar com
uma feliz expressão de Santo Agostinho, do papai eu tenho um “santo orgulho”.
FILIPE
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