Quem tem a “fortuna” de conviver comigo já teve o infortúnio de perceber que sou uma pessoa pouco suportável. Talvez por isso meu círculo de amigos seja muito pequeno e sem que eu tenha pretensões de ampliá-lo. Meu cotidiano é bastante monótono e muitas vezes procuro um refúgio para, em voluntária solidão, fazer acertos e reparos em minha maculada alma. Todavia, estando com pessoas com quem tenho afinidade, costumo ficar à vontade para expor pontos de vista. Foi mais ou menos isso que me aconteceu dois dias atrás.
De manhãzinha, assim que cheguei à escola, um pequeno grupo de
colegas começou a falar sobre os malefícios causados por aquela figura abjeta
alçada à presidência da República. Havia manifestações de caminhoneiros com
obstrução de rodovias etc., e uma amiga estava indignada porque um familiar
dela, que também é caminhoneiro, e mesmo sofrendo as agruras socioeconômicas
desse desgoverno, defende o ogro. Até esse momento todos falávamos serenamente.
No entanto, uma professora chega subitamente, entra na roda e dardeja: “Agora
tudo é culpa do Bolsonaro! É só ele?!” Todos a olhamos assombrados, quase sem
ter o que dizer, mas lancei um torpedo: “Sim, ele é um capeta!” Eu disse
“capeta”, mas não deveria escrever isso porque meu pai, que costuma ler
este blog, deverá me passar um corretivo – não em defesa do ’capeta’ ops!, mas
por que não devemos xingar ninguém, nem mesmo aquele ‘coisa-ruim’.
Mas a mulher “chegou chegando”, como dizem os ‘modernos’, e
dominou a banca. Dos que participavam da roda, três se calaram, restando apenas
uma amiga e este infortunado, que sou eu. Dedo em riste na nossa direção, ela
vociferava: “Vocês são comunistas, petistas e só querem bagunça. Nós não. Somos
gente de bem, somos família. Bolsonaro é pela família.” “Sim, Bolsonaro gosta
tanto, que já está na quarta família!”, ironizei. Mas a intrépida senhora
estava disposta a continuar o entrevero, e tinha energia para isso. Disse
(gritando) sobre o progresso que Bolsonaro teria levado ao Nordeste, agora com
estradas e muitas outras coisas boas que só ele, mais ninguém, foi capaz de
fazer.
Eu estava apanhando bastante da bolsonarista e tentei me defender,
agora atacando: “Você é professora e não conhece a história do Brasil?!”
“Conheço, sim. Eu fiz direito, sabia?” “Ah, fez?... Mas não parece. Não sabe o
que foi a ditadura militar, endeusada pelo genocida, nem o que foi a tortura,
que ele defende...” “Então... você, que sabe muito, venha dar aula pra nós!”
Nisso entrava o professor de história, a quem ela abordou para lhe dizer: “Olha,
o sabe-tudo ali vai dar aula de história pra nós!!!” O professor não estava
entendendo nada do que acontecia (sorte dele), mas ficou um tempinho ali,
tentando dar pé do ocorrido. E eu, já agastado com tudo, encerrei com esta: “É
um absurdo professor não conhecer a história recente do país. Que futuro terão
nossos jovens?...”
Não sei o que mais aborrece: se esse fla-flu
entre “gente de bem” e “gente do bem” ou a indigência intelectual de nossos
mestres.
FILIPE
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