sexta-feira, 12 de junho de 2015

BODAS DIAMANTINAS

Papai está indo para os oitenta e cinco; mamãe, recentemente, completou setenta e seis; e em julho próximo, Deus querendo, eles hão de celebrar sessenta anos de casados.  Sessenta anos! Quase não acredito, mas é verdade. Meu Deus, como o tempo passou! Há pouco, bebês brotavam no quarto ao lado e ainda ouço choros cindindo as madrugadas, mas aplacados com o seio materno ou com o paterno mingau de fubá numa mamadeira.

Cena recorrente, aquela: a um tênue gemido se seguia um riscar de fósforos. Papai sempre deixava ao lado da cabeceira de sua cama uma lamparina e uma caixa de fósforos para essas e outras providências. Parece ontem, mas esta memória traz meio século de nossa história. Acesa a lamparina, papai se dirigia à cozinha para preparar, quando não o dito mingau de fubá – que era o menu principal de sua trezena prole –, um chá de erva-doce para aquele rebento chorão.

Nas minhas conversas com o Velho, costumo dizer: “Pai, nós, que já envelhecemos, sabemos que as coisas não funcionam assim (...)”. De certa forma, essa intimidade etária me deixa orgulhoso. A idade, além da velha e surrada experiência, lega-nos algum glamour.

Papai está animado, parece uma criança esperando ansiosa pelo aniversário, que demora para chegar, e em sua página do “feice”, sempre alude ao evento que se aproxima. Ele não diz, mas sinto sua impaciência e quase leio o que pensa: “Tá demorando muito, não chega nunca...”. Calma, pai, estamos quase lá.

Mamãe é uma incógnita e parece alheia a tudo. Quem a vê, pensa isso, mas se engana. Para compreendê-la, é preciso ser iniciado no assunto. Talvez seja necessário fazer um ‘curso intensivo’ com papai e um pequeno ‘estágio’ com mamãe na casa dela. Somente assim se perceberá sua perspicácia e verá que aquele ‘jeito alienado’ é para enganar trouxas. Uma prova disso? Recentemente, enquanto papai conversava com os ‘amigos e amigas’ do “feice”, mamãe disse apontando o indicador para o seu “Cabeça Branca”: “Sei lá que é aquilo. Ele fica cochichando ali...”. Provocada a usar o computador, defendeu-se enfática: “Ih, sei mexer com aquilo não, menino. Eu, não. Não quero e não vou de jeito nenhum!”

Figura de proa de nossa família, mamãe é destaque no segundo livro de papai, que acaba de ser encaminhado à gráfica. Sob cuidadosa e refinada revisão de meu irmão sacramentino, o livro ostenta na capa a imagem de minha mãe. Em suas páginas, com narrativa digna de um ‘Guimarães Rosa do Rio dos Bagres’, papai descreve várias e instigantes passagens da vida de sua companheira de “Lutas e Vitórias” nessa longa e abençoada jornada.

Diamante vem da palavra grega “adamas”, que significa força e eternidade. E as bodas de meus pais são mesmo de diamante! Mas não poderia ser diferente, pois nestas bodas, como naquela diminuta rocha carbônica, há um misto de simplicidade, beleza, dureza, preciosidade e pureza que, juntas, formam uma singular unidade.

Bodas... Sexagésimas e diamantinas bodas!

FILIPE





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