Papai está indo para os oitenta e
cinco; mamãe, recentemente, completou setenta e seis; e em julho próximo, Deus
querendo, eles hão de celebrar sessenta anos de casados. Sessenta anos! Quase não acredito, mas é
verdade. Meu Deus, como o tempo passou! Há pouco, bebês brotavam no quarto ao
lado e ainda ouço choros cindindo as madrugadas, mas aplacados com o seio
materno ou com o paterno mingau de fubá numa mamadeira.
Cena recorrente, aquela: a um
tênue gemido se seguia um riscar de fósforos. Papai sempre deixava ao lado da
cabeceira de sua cama uma lamparina e uma caixa de fósforos para essas e outras
providências. Parece ontem, mas esta memória traz meio século de nossa história.
Acesa a lamparina, papai se dirigia à cozinha para preparar, quando não o dito
mingau de fubá – que era o menu principal de sua trezena prole –, um chá de
erva-doce para aquele rebento chorão.
Nas minhas conversas com o Velho,
costumo dizer: “Pai, nós, que já envelhecemos, sabemos que as coisas não
funcionam assim (...)”. De certa forma, essa intimidade etária me deixa
orgulhoso. A idade, além da velha e surrada experiência, lega-nos algum
glamour.
Papai está animado, parece uma
criança esperando ansiosa pelo aniversário, que demora para chegar, e em sua
página do “feice”, sempre alude ao evento que se aproxima. Ele não diz, mas
sinto sua impaciência e quase leio o que pensa: “Tá demorando muito, não chega
nunca...”. Calma, pai, estamos quase lá.
Mamãe é uma incógnita e parece
alheia a tudo. Quem a vê, pensa isso, mas se engana. Para compreendê-la, é
preciso ser iniciado no assunto. Talvez seja necessário fazer um ‘curso
intensivo’ com papai e um pequeno ‘estágio’ com mamãe na casa dela. Somente
assim se perceberá sua perspicácia e verá que aquele ‘jeito alienado’ é para
enganar trouxas. Uma prova disso? Recentemente, enquanto papai conversava com os
‘amigos e amigas’ do “feice”, mamãe disse apontando o indicador para o seu
“Cabeça Branca”: “Sei lá que é aquilo. Ele fica cochichando ali...”. Provocada
a usar o computador, defendeu-se enfática: “Ih, sei mexer com aquilo não,
menino. Eu, não. Não quero e não vou de jeito nenhum!”
Figura de proa de nossa família,
mamãe é destaque no segundo livro de papai, que acaba de ser encaminhado à
gráfica. Sob cuidadosa e refinada revisão de meu irmão sacramentino, o livro
ostenta na capa a imagem de minha mãe. Em suas páginas, com narrativa digna de
um ‘Guimarães Rosa do Rio dos Bagres’, papai descreve várias e instigantes
passagens da vida de sua companheira de “Lutas e Vitórias” nessa longa e
abençoada jornada.
Diamante vem da palavra grega “adamas”, que significa força e
eternidade. E as bodas de meus pais são mesmo de diamante! Mas não poderia ser
diferente, pois nestas bodas, como naquela diminuta rocha carbônica, há um
misto de simplicidade, beleza, dureza, preciosidade e pureza que, juntas, formam
uma singular unidade.
Bodas... Sexagésimas e diamantinas
bodas!
FILIPE
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