Tá horrível a coisa aqui. Um
calor insuportável, um vizinho escroto com uma bateria dos infernos e eu tentando
atualizar meu blog. Se na calmaria da madrugada já não consigo grandes feitos,
imagine agora, na aridez desta tarde calorenta e acrescida dos decibéis de
alguém sem noção de civilidade... Mas vou tentar. Quem sabe, na companhia de
uma sinfonia de Mozart, eu consiga sublimar o purgatório que me sufoca o
espírito e me entorpece a alma?...
Aumento o volume do aparelho, o
violino geme enquanto vou cofiando os neurônios a procura de algo. Penso que
hoje, sendo feriado, facilitaria. Mas não. Amanhã, se alguém acessar o blog, ficará
espantado com tanta baboseira de quem se diz professor. Calma! Professor é
assim mesmo e você já teve muitos. Todos são neuróticos, não suportam barulho,
nem mesmo o de uma caneta sobre a carteira. Principalmente quando a Fulana
insiste no batuque, embalde os pedidos clementes para que pare, ao que
responde: “Eu não consigo parar!”. Consegue. Posta para fora com a incumbência de continuar
batucando, cansou e parou de vez.
Ah, mas aquela caneta batucando
na carteira seria “música suave” perante o que acontece por aqui. Uns caras metidos
a roqueiros e que provavelmente – e eu torço muito para isso – nunca passarão
de amadores sonhando tocar nos vespertinos da TV aberta. Boçais é o que são.
Hoje é o ‘dia do professor’. Este
ser bajulado hoje, mas desrespeitado sempre, principalmente pelos governantes.
Não acho que somos especiais, só acho que deveríamos ser valorizados,
compreendidos, cobrados também. Mas, pelo amor de Deus, dê-nos condições
físicas, psicológicas e retaguarda moral para o exercício da profissão!
A cada dia e a cada aula uma
surpresa, boa ou ruim, nos aguarda. Eu teria muitas coisas boas para dizer sobre
este ofício que abracei com incondicional volúpia. Mas o meu vizinho... Este me
obriga a falar mal da minha profissão, da tarde, de tudo. Então vou reclamar de
meu cotidiano, que muitas vezes me embebeda com fel.
Certa feita, ao entrar na sala de
aula, havendo poucos alunos devido a uma chuva forte (faz tempos!), pensei:
“Hoje a aula vai render, pois posso ensinar de forma individualizada. O assunto
– sem querer ser pedante nem afrontar os não iniciados – era “Números Complexos”. Comecei falando da inconveniência do nome, da “maldade”
dos matemáticos. Com um título desses, quem se animaria? ‘Complexo’ evoca
complicação. Como simplificar aquilo que já se apresenta como ‘complexo’?
Tentei desembaraçar as coisas, muito animado, por sinal. Uma Fulana, não muito
dotada de boa vontade (alguém diria vagabunda, preguiçosa; eu não) entrava e
saía da sala para cuidar de interesses outros. A certa altura, virou-se para
mim, dizendo: “Eu não entendi NAAAADA!” Fiquei meio sem o que dizer e receitei
reforço. Brava, deu-me instruções de que o meu papel era o de ensinar etc. E em
seu socorro, veio uma das melhores da sala. Isso é que doeu. A moça,
aparentemente educada e estudiosa, berrou: “Já ouvi dizer que se um aluno
pergunta, o professor é obrigado a responder quantas vezes forem necessárias!” Tentei
argumentar, mas a coisa foi entortando de vez. Sorte minha é que as duas não conseguiram
a tão sonhada maioria na classe. Em meu socorro, um jovem disse: “Cala aí, ô!
Se não aprendeu, é porque fica conversando... Presta atenção no professor e pare
de reclamar!” Dei muitas graças a Deus e a esse herói improvável. Revigorado,
pude bradar sem muita convicção, é claro: “Comigo, só não aprende quem não
quer!” Disse e repeti, para gáudio de meu defensor, alegria da classe e desagravo
face às duas contendoras.
FILIPE
Nenhum comentário:
Postar um comentário