sexta-feira, 15 de julho de 2016

O HOMENZINHO IMPERTINENTE

Postado originalmente em 26/08/2011 no “blogdofilipemoura”
Quase sempre chega atrasado. Apressado, com o boné numa das mãos, olhando para os lados e com um meio sorriso naturalmente esculpido, aquele homenzinho toma assento num dos bancos da capela. Busca sempre o mesmo lugar e caso já tenha alguém ali – não importa quem, nem quantos –, o problema é de quem chegou antes. Ele vai se enfiando entre um e outro: empurra o primeiro, o segundo, e o terceiro escapa furioso. Já sentado, seu boné ainda está na mão e será preciso acomodá-lo ao lado. Portanto, alguém mais terá que se espirrar dali.
Ninguém se move. Enquanto isso, o sacerdote continua a celebração, a assembleia entoa cantos e faz as preces. Mas o intrépido senhor não desiste. Está decidido que seu boné terá que ficar ‘sentado’ ao seu lado e dará um jeito nisso. Impaciente, gesticula-se batendo levemente os pés no genuflexório. Não sendo isso suficiente, começa a fazer uns ruídos. A ausência de dentes lhe possibilita produzir algo muito semelhante àqueles sons que emitimos – não pela boca, é claro –, mas que fazemos somente na ‘solidão do trono’. E percebendo a eficácia deste método, anima-se. Capricha nos vocais e, pouco a pouco, começa a debandada. Primeiramente uma ruborizada mocinha; depois, aquela sobranceira senhora; agora, um esguio senhor com fumos de barão também se rende.
Finalmente, o homenzinho vê-se livre daquela ‘gente incômoda’. Sozinho, estica bem os braços espalmando as mãos sobre o ‘império’, agora sob seu domínio, a que se tornara o banco. Contempla orgulhoso aquela vastidão de madeira e então decide participar, triunfante, da missa que já termina.
P.S.: “Tuto”, este era seu nome, faleceu dias atrás, aos 79. Que Deus o acolha e o acomode confortavelmente num dos ‘bancos’ do Reino!

FILIPE

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