Meu querido irmão Filipe, paz e bem!
Que bicho estranho eu sou, né? Você até se antecipou ao meu aniversário
e eu, nada!
Mano, muito lhe agradeço as palavras de sincero afeto por ocasião de meu
natalício! A gente é humano e se alegra pela amizade e pelas expressões de
carinho, sobretudo quando são expressões da alma! Estou muito feliz de chegar
aos 44! (um pouco preocupado também, é verdade... Tô ficando velho e às vezes
isso assusta! Coisas para integrar!)
Mano, como de outras vezes, consegui passar uns dias, durante o meu níver, no Morro [um eremitério], lá em
Guarapuava. Dessa vez foi bem diferente, pois fiquei sozinho. Na primeira noite,
fiquei meio receoso (ansioso). Me chuchei
cedo debaixo das cobertas – na verdade, o meu mantéu de frade. Não levei
cobertor, pois achei que lá já teria, ou quem sabe..., é verão ainda e estaria
mais quente. Passei um frio danado. Aos poucos, fui me acalmando e só não dormi
melhor mesmo, devido ao frio. No segundo dia não pousei lá, mas no Convento,
por causa de compromissos. Então voltei, levando um cobertor na guaiaca e aí
pude dormir bem. Encontrei cobra escondida na latrina (jararaca), que ficou lá
até o final, e duas baitas aranhas em noites diferentes. Mas isso não me
assustou. Pude acender o fogãozinho, bem mais precário que esse aqui [do
eremitério] de Ponta Grossa. Mas é algo tão singelo ver aquele fogo crepitando,
a fumaça corcoveando, aquele arzinho de se estar em casa, mas ao mesmo tempo
tão só. A natureza exuberante, muita chuva, muitos pássaros... E, sobretudo, estar
a sós com Deus. Não ter pressa de rezar, não consultar muito o relógio, deixar
o dia fluir entre pequenas leituras espirituais e atos de entrega, confiança,
pedidos e louvor ao Criador, que nos envolve por dentro e por fora.
Tudo isso não é lá tão romântico assim. Às vezes vem o vazio, o tempo
não passa. Então, é hora de alguma atividade física: buscar lenha, pedras para
a construção, água na mina... Esquentar a água e tomar banho de cavalo (é
isso?), usando-se uma pet. Deita-se
cedo para combater o medo e também por estar sempre chuvoso. E acordar para o
louvor, iniciando o dia com o rito de acender o irmão fogo. Depois, mais tarde,
da capelinha próxima, de pedra, escutar a água já chiando na panela... Deus
seja louvado!
A tal da cobrinha deu trabalho. No penúltimo dia, à noite, um grupo
apareceu por lá. Um deles era militar e eu pedi para dar um jeito de retirar a
peçonhenta, pois poderia machucar alguém desprevenido. Ele se prontificou,
arrumando um barbante e uma forquilha para imobilizá-la. Tudo pronto para a
ação louca de arriscada, quando aparece um companheiro, descontado da ideia
(muito gente boa, em geral) com um trago de pinga na cabeça e se atirou sobre a
cobra, pegando-a à unha. Foi imediatamente picado e levado às pressas para o
hospital (descer todo o morro a pé, pegar o carro lá embaixo, e por estrada de
chão de uns 3 km, a procurar recurso). Salvou-se, mas amargou uns quatro dias
de hospital... Quem sabe tenha aprendido, pois estragou a nossa noite!
Mano, tô comprido hoje, né?! Fico por aqui. Estou bem, graças ao bom
Deus. Sábado passado tivemos a ‘sopa na rua’: mais de trinta jovens juntos.
Lembrei-me de você. Ah, a Indiasara, de Guarapuava, também mandou abraços, e o
povo do Fernando!
Deixo-lhe um abraço muito carinhoso. Desculpe o “sumiço do tio Gerson”
no paiol. Não sei se é o “espírito do Vô Aurélio”, que me faz cair na capoeira!...
Mas estamos bem!
Saudações para a Rosana.
Seu Frei Gabriel
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