Hora do recreio. Entro na fila da
merenda na escola em que trabalho. Nas mãos, tenho um jornal com artigo de
Suzana Herculano-Houzel, uma renomada neurocientista que deixou as
universidades brasileiras para se radicar nos EUA, onde desenvolve pesquisas em
sua área. Seu último texto versa sobre algo que domina como poucos: isquemia
cerebral. Tiro os olhos do jornal e tento enxergar o balcão de serviço da
cozinha, que continua longe de mim. De uns tempos para cá, tenho observado um
fenômeno que talvez desperte algumas mentes mais argutas, como às de sociólogos:
enquanto a fila da cantina da escola encolhe cada vez mais, a da merenda
espicha consideravelmente. Parece que a grana da moçada está miúda ultimamente.
Volto à leitura.
De súbito, algo faz meus olhos se
deslocarem do jornal para a “zona de dispersão”, onde pratos cheios de macarrão
com molho e frango desfiado tomam rumos diversos. Uma professora esbraveja com
alguém que eu não conheço, e que parece não ouvir ou não querer escutar a
reprimenda. Em pouco tempo eu soube do que se tratava. Um rapaz, de quase dois
metros, espancava um garoto com dois terços de seu tamanho. Em vão foram os
apelos para que ele deixasse o moleque, que, estirado no chão, era socado com volúpia
diabólica. A custo, o algoz, um tipo ‘mano‘
enfiado num moletom com capuz, foi retirado pela professora e conduzido à
direção. A vítima, que nem pôde merendar, foi para uma sala onde permaneceu à
espera dos pais, que logo chegaram para tomar as urgentes e necessárias providências
contra o agressor.
Outro caso, infelizmente ainda mais
grave do que aquele, aconteceu noutra escola do interior paulista. Um professor
com mais de sessenta anos foi covardemente agredido por um adolescente. A
imagem que vi na tela de um celular era a de um homem simples, como um
lavrador, mostrando a face lacerada e a camisa ensanguentada. Provavelmente aquele
homem terá entrado tardiamente no magistério, tentando melhorar de vida ou realizando
um sonho antigo. Seus olhos aflitos expressavam algo bem mais do que tristeza.
Havia neles indignação, impotência, frustração.
Ontem, voltando do serviço e
descendo por uma rua, próximo a um cruzamento, uma bicicleta passou rasante e
velozmente por mim na minha calçada. Não mais do que um segundo foi o tempo que
me livrou de um atropelamento com possíveis fraturas. Olhei para o ciclista,
que já ia distante, e vi um moletom cobrindo um corpo comprido com uma cabeça
também encapuzada – como o agressor do pátio da escola.
Enquanto a violência grassa forte
nos pátios, corredores e salas de aulas, o atarantado ministro colombiano está
preocupado com ‘hino nacional’ e demais símbolos pátrios, que nem ele sabe para
que servem.
FILIPE
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