sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

VOLUMES MORTOS

Não, eu não conhecia “volume morto”. Conheço, desde sempre, “peso morto” – algo imprestável e que nos atravanca. Alguns “pesos mortos” obstruem o meu caminho, mas melhor não citá-los. Há também arquivo morto, uma seção onde se guardam os documentos antigos, alimento dos historiadores e de ácaros. Ângulo morto eu conheci quando ainda envergava a farda verde-oliva, e se trata de uma região escondida do campo de visão. Quando se está numa elevação no meio da mata e se avista outro morro, o vale escondido compõe o tal ângulo morto. Se há ângulo vivo, não fiquei sabendo, pois os instrutores militares não me apresentaram.

Mas o assunto de hoje deveria ser somente “volume morto”. Da primeira vez que ouvi essa palavra fiquei desconfiado, pensando ser algo ruim. Mas não. É o volume morto da Cantareira que tem matado a sede de muitos paulistas durante esta crise hídrica – ou seca, para não usar essa expressão besta, pretensamente glamorosa. Mas, quando o tal volume morto já começava a morrer, eis que o governo paulista – que não chega a ser um “peso vivo” – descobre, nas suas soturnas explorações, mais um “volumoso defunto”. Com essa nova reserva (meio barrenta, malcheirosa, mas água) e as estivais “águas de fevereiro”, o povo do novo semiárido poderá atravessar o próximo estio – que promete ser penosamente longo –, até que este rico estado resolva investir em reúso, cisternas ou dessalinização, como há tempos já fazem os israelenses.

A informação também tem o seu volume morto, algo quase inacessível. Mas para alcançá-lo, é necessário descer aos abismos, cavoucando sites, jornais impressos, televisivos e radiofônicos. Somente assim pode-se ficar sabendo pormenores do envolvimento de um grande banco (HSBC) em esquema internacional de lavagem de dinheiro. O HSBC é ligado às famílias Safra e Andrade Vieira, que, por sua vez, são ligadas aos grãos-tucanos paulistas. Aquele banco, que tem filial em Genebra, lava qualquer dinheirinho. Seja do rei de Marrocos, narcotraficantes mexicanos ou de brasileiros corruptos. E fica branquinho o danado.

Colunistas da Folha de S. Paulo, dentre os quais Vladimir Safatle e Kenneth Maxwell, informaram recentemente que mais de 500 bilhões de reais passaram pela filial suíça do HSBC num intervalo de tempo inferior a cinco meses. A notícia brotou de um furo no “casco” feito por um funcionário dedo-duro daquela instituição. Muito mais, porém, repousa nos subterrâneos do sistema financeiro internacional. Segundo pesquisadores, a corrupção consome cerca de 5% do PIB mundial. Isso significa que, a cada ano, 1,5 trilhão de dólares vão para o “volume morto” de paraísos fiscais, como o HSBC, ou para bolsos mais modestos, mas nem por isso limpos.

Ainda sobre o HSBC: O Brasil aparece como sendo o nono país que mais operou lavagem naquele banco, com milhares de brasucas envolvidos. Mas nenhum nome foi identificado na mídia, por quê? Temos competentes Ministério Público, Judiciário e TV Globo, que juntos, justa ou injustamente, desancaram uma nuvem de petistas. No entanto, um tumular silêncio cobre a plutocracia tupiniquim afundada nesse lamaçal.

Parafraseando George Orwell no clássico “A Revolução dos Bichos”: “No Brasil, todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros”. 


FILIPE  

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