sexta-feira, 9 de outubro de 2020

APELIDOS

Em casa, papai nunca permitiu que colocássemos apelidos uns nos outros. À primeira tentativa, o temido franzido na testa era suficiente para pôr fim na ousadia. Talvez por isso, eu nunca me senti à vontade para chamar alguém por apelido, preferindo sempre o “nome de batismo”. Contudo, não se deve radicalizar, e exceções são bem-vindas. Explico.

 

Tive uma aluna, a dona Tina, cujo nome de batismo era Libertina. Nesse caso, vai fazer o quê?... Não se discute e nem precisa explicar por que ‘Tina’ fica bem melhor que ‘Libertina’.

 

Numa ocasião, uma senhora me procurou para conversar sobre a Joana D’Arc, sua filha e minha aluna. “Ela não quer vir mais para a escola, porque as meninas ficam a chamando de Joana e ela não gosta do nome...”, reclamou. “Mas esse nome é tão bonito!... Agora, se fosse Sebastiana...”, tentei consolar. “Mas eu me chamo Sebastiana, professor!”, ela me disse cheia de rubor e de furor. “Mas esse nome é bonito também”, tentei consertar e continuei: “Se-bas-ti-a-na!!! Quanta sonoridade! Sabia que meu avô se chamava Sebastião?!” É, o estrago foi grande e não teve mais jeito. Ela se foi e sua filha nunca mais apareceu.

 

Tive um vizinho cujo nome não lembro, mas que poderia ser Nicanor. Pois bem, certa vez procurei o “Nicanor” para tratar de alguma coisa. Chegando, pedi seu nome e ele me respondeu: Meu nome é Nicanor, mas pode me chamar de Chula. Todo mundo aqui me conhece por Chula”. Achei estranho, mas diante daquela exigência eu não tive alternativa.

 

Tem também o Paulo, um senhor muito querido que, por ser forte, másculo e ter um vozeirão, deveria ser chamado de Paulão. Mas não. Na cidade, ninguém conhece o ‘Paulo’ e muito menos o ‘Paulão’. Agora, se alguém de fora chegar e perguntar quem é o Bruxa, todo mundo sabe.

 

A minha obstinação em querer evitar apelidos já me deixou em situação vexatória. Certa vez, rodando pelas ruas de Mauá com um tio – que todos conhecem pelo apelido e jamais pelo nome –, cruzamos com um senhor que voltava para casa com umas ferramentas de pedreiro. Meu tio parou o carro e gritou: “Ô, Manguaça, esse aqui é meu sobrinho e vai ser seu vizinho”. O homem parou, simpático, conversou conosco e se despediu. No dia seguinte, fui até o local onde estava começando a construir minha casa e avistei o meu futuro vizinho. Fui até ele, agora como “velhos conhecidos”, e me adiantei nos cumprimentos: “Bom dia, seu Manguaça!” “Manguaça, não. Meu nome é Antônio”. “Uai, o meu tio falou seu nome errado...” “Aquele seu tio não presta, mas quero que me chame de Antônio”. “Então, seu Antônio, o senhor me desculpe. É que eu não sabia mesmo”, consertei.

 

Encontrando meu tio, falei com sobre o ocorrido, ele deu risada e falou: “Ele é pinguço, sabia não?...”. Mas o seu Antônio não era pinguço (pelo menos não mais) e eu não sabia o significado da palavra ‘’manguaça’’, que descobri sem suavidade.

 

FILIPE

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