Fazendo memória nestes dois anos da ‘passagem’ de meu Velho,
começo este texto ouvindo “Esteio de Aroeira” – um clássico da dupla Zé Fortuna
e Pitangueira. “Meu
pai que também era o esteio firme da família (...)” – ouço
emocionado.
Na última vez que visitei meu pai, estávamos jogando cartas quando
me veio a ideia de pôr algumas músicas pra tocar e enfeitar nosso lazer.
Comecei por “Esteio de Aroeira”, tendo a certeza de que ele a conhecesse e
apostando que gostasse dela, mas não foi bem assim. Papai, que até então
escolhia atentamente as cartas que formariam canastras e aquelas que deveria
descartar, desviou o foco para aquela música, que o embevecia. Ao final,
perguntei se a conhecia, e para minha surpresa ele disse que não, mas que achou
muito bonita. Na foto acima, um registro daquele carteado, que foi o último; no
dia seguinte ele seria internado pra não mais voltar.
Desde a primeira vez que ouvi ‘Esteio de Aroeira’, e isso já faz
muitos anos, a imagem de meu pai me veio solene com ela. Ainda assim, não sei
por que, eu nunca havia pensado em pôr essa música para ele ouvir. Nem mesmo
quando lhe dei uma caixinha de música com um pen-drive contendo mais de uma
centena de clássicos da música sertaneja-raiz. Ali havia sucessos de Tonico e
Tinoco, Liu e Leu, Pedro Bento e Zé da Estrada, Zilo e Zalo, Pena Branca e
Xavantinho, e até mesmo de Zé Fortuna e Pitangueira, mas não havia ‘Esteio de
Aroeira’.
Meu pai sempre gostou de música e cresceu ouvindo rádio. Numa
ocasião, quando ele era pouco mais do que um menino, talvez no começo da década
de quarenta, meu avô Sebastião comprou um rádio a válvula, que era ligado
sempre à noitinha. A energia elétrica vinha de uma pequena usina construída por
esse avô, e o gerador conseguia abastecer duas ou três casas na redondeza.
Em torno daquele rádio, a família Lopes de Lima recebia a vizinhança para
ouvir a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, a mais famosa na época.
O tempo passou, meus pais se casaram e compraram um rádio a
válvula semelhante àquele do meu avô. Certa feita, o casal teve que se mudar
para uma casa mais distante, de forma que ficaram sem eletricidade e... sem
rádio! E assim se passaram muitos anos até que, com a família já grande e para
a alegria de todos nós, papai adquiriu um rádio a pilha.
Os anos foram passando ainda mais velozmente e a tecnologia foi
chegando à nossa casa. Agora papai já podia assistir televisão, ouvir rádio à
vontade, mas ainda não tinha internet e nem queria saber dessas ‘modernidades’.
No entanto, foi a caixinha de música com aquele pen-drive que fez a alegria de
meu pai por bastante tempo. Sempre que eu chegava, lá estava ele fazendo
palavras cruzadas e com a caixinha ligada, ouvindo música.
O tempo deu outro salto e na casa de meu pai chegou um notebook. Agora
com o computador, tudo mudou radicalmente. Papai tornara-se um internauta e
passou a se ocupar com seus inúmeros ‘amigos e amigas’ do Facebook. E foi
a partir daí que a “minha” caixinha de música foi aposentada e dela nunca mais
se teve notícia.
Enfim, há exatos dois anos, papai foi ‘tombado pelo tempo’. E como
aquele sempre lembrado ‘velho esteio de aroeira’, o ‘Velho Esteio’ da nossa
família jamais será esquecido.
FILIPE
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